Marcelo Jesus/UOL
Sempre que contrariado, o crime mostra a cara. A bandidagem migra dos subterrâneos para os refletores. Em São Paulo, o PCC. No Rio, o Comando Vermelho.
Atacam instalações policiais, promovem arrastões, incendeiam veículos, atiram a esmo, afrontam as forças do Estado.
Há uma semana, um desses surtos de visibilidade voluntária dos criminosos convulsiona a (a)normalidade carioca.
A novela se repete. Os criminosos deixam o núcleo de figurantes do mal, roubam a cena e viram estrelas no ‘Jornal Nacional’.
Conforme já realçado aqui em capítulos anteriores, sob o enredo de violência pulsa um personagem invisível, bem-nascido e narigudo.
O mercado da droga, base da criminalidade, se pauta pela lei da oferta e da procura, não pelas normas do Código Penal.
Nesse mercado, o principal produto levado pelos criminosos à gôndola é a cocaína. Coisa cara, acessível apenas aos melhores bolsos.
Pois bem. Se se vende cocaína no Brasil, é porque há quem a aspire. Se se vende muita cocaína, é porque há quem a sorva em grandes quantidades.
Neste sábado (27), começou a circular no Rio um adesivo mimoso: “I Love Rio” (o amor é representado por um coraçãozinho).
Os portadores da mensagem aplaudem a presença dos tanques das Forças Armadas na Vila Cruzeiro e no Complexo do Alemão.
Falam das quadrilhas de Elias Maluco e de Marcinho VP com ira inaudita. simultanemanete, erguem barricadas de silêncio em torno do sujeito oculto.
A elite carioca se une contra o tráfico do morro. Mas consome a cocaína que financia o armamento pesado da criminalidade.
O nariz invisível não está na favela. Ele empina suas narinas em ambientes mais sofisticados: coxias de shows, camarins de desfiles, redações de jornal...
Entre uma cafungada e outra, Armanis e Versaces, reunidos nas coberturas chiques da Zona Sul, se dizem chocados com a onda de violência.
A guerra ao narcotráfico rende imagens plásticas e boas manchetes. Mas será infrutífera enquanto os holofotes não iluminarem o sujeito oculto.
Visto como culpado inocente –ou inocente culpado—, o nariz que cheira nas grandes metrópoles é, em verdade, cúmplice da mão que segura a metralladora no morro.
Vencida a barreira da hipocrisia, pode-se encarar o problema a sério. A repressão é a parte mais óbvia da solução.
Um descalabro de décadas não se resolve do dia pra noite. Além de acionar os tanques, será preciso limpar a polícia e humanizar os presídios.
De resto, deve-se prover trabalho à mão de obra que serve ao tráfico e potencializar a estratégia que injeta Estado em comunidades dominadas pelo crime.
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